segunda-feira, 17 de março de 2014

Crítica: Entre Nós


O grande problema da maioria dos trailers e sinopses é desvelar demasiadamente a trama dos filmes anunciados. Não que isso importe muito no caso de Entre Nós, de Paulo Morelli e Pedro Morelli, já que o “segredo” da trama é desvelado desde o começo, cabendo ao espectador a paciência de acompanhar o desfecho (!?). O drama, com insinuações de suspense, reforçado pela irritante e intrusiva trilha sonora, trata de dois encontros de um grupo de sete amigos numa aprazível casa de campo, na Serra da Mantiqueira.

O primeiro é em 1992, quando, entre as abobrinhas (bobagens!) sobre sexo, política, esporte, literatura, que dão o tom às suas conversas, regadas a muito álcool e erva..., os sete resolvem expor seus anseios em cartas pessoais para serem abertas após dez anos. O segundo é em 2002, quando, entre as abobrinhas (bobagens!) sobre sexo, política, esporte, literatura, que dão o tom às suas conversas, regadas a vinho e comida..., eles sentem que estão bem menos amistosos. Rusga daqui e dali, frustração e inveja acolá... Até a árvore que sombreava a cova onde foram enterradas as cartas está diferente.

Entre Nós, que tem a fotografia monumental de Gustavo Hadba como protagonista, traz em seu elenco Caio Blat, Júlio Andrade, Maria Ribeiro, Martha Nowill, Carolina Dieckmann, Lee Taylor e Paulo Vilhena, em um enredo que equilibra mal seus excessos melodramáticos. Enquanto o preciosismo fotográfico, mesmo dando sinais de cansaço (na ânsia de um ângulo novo), chega ao final com algum gás, a narrativa acaba muito antes, perdida na puerilidade, na pretensão de fazer a história parecer maior do que realmente é. O pretérito é uma grande cilada para quem não consegue conjugar além do lugar comum da frase feita (ninguém chega ao poder sem se sujar). Prever um futuro conhecido é fácil, basta selecionar as informações, conforme o impacto desejado, e jogá-las na tela. O grande exercício da ficção é prever o amanhã, sem uma cápsula midiática do tempo.


O elenco, com personagens pouco inspirados, tem uma interpretação irregular, convence mais em 1992 (natural) do que em 2002 (caras e bocas). Já o roteiro, simplório em seu argumento, subestima a inteligência do espectador, ao preferir “falar” (com a profundidade de um pires) das mazelas da amizade (e outras frugalidades) em detrimento de um assunto muito mais interessante e pertinente: a ética. Todavia, como qualquer “diálogo” (entre os amigos) não vai muito além de uns dois ou três rebates inconclusivos (óbvio!), talvez o melhor é que (a ética) continue no subtexto. Ah, a falta que faz um bom vocabulário!

Entre Nós é pontilhado por signos (pedra, escaravelho, árvore) que, dependendo da leitura do espectador, podem resultar em interessantes metáforas ou em boa viagem na maionese, tipo: livro Ponto de Fusão = cordeiro no forno. O que remete ao “dilema” do escritor (em 2002), que já foi assunto melhor resolvido em recente filme de Woody Allen. Quanto à trilha, vale apenas pela inclusão da deliciosa canção Na Asa do Vento, de João Donato, mesmo não provocando a ruptura desejada.

O ”drama” (à beira do dramalhão), que parece escrito a toque de caixa, carece de humor, antes de se perder (em 1992) e principalmente depois de se encontrar (em 2002), quando a rabugice (e a caricatura!) bate o ponto. Na verdade, a primeira parte até que tem alguma graciosidade, mas está longe de ser engraçada. A insistência (!) em dramatizar a tudo acaba resultando na superficialidade de toda a trama: personagem hipócrita: O que eu fiz da minha vida?; personagem que sabe da falcatrua do personagem hipócrita: O que você fez da sua vida?; espectador que condenar o personagem hipócrita: O que ele fez da vida dele?

2 comentários:

  1. Achei que o filme valeu pela ousadia de Morelli, diferente do que temos visto nas últimas produções cinematográficas brasileiras, ele ousou em um suspense. Muitos ótimos filmes brasileiros já foram lançados, mas recentemente a comédia tem dado um tom pitoresco no cinema nacional. Eu gostei bastante do filme, principalmente na segunda fase, quando a nostalgia, os anseios mal realizados e todo o suspense vêm a tona. Acho que a interação entre os atores é boa também, fato devido a amizade deles fora das telas.
    Enfim, não é o melhor filme de março, mas também merece ser aplaudido por suas qualidades fotográficas e por fazer diferente.

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    Respostas
    1. ..., olá, Retrato de Iaiá,
      o bom da arte é permitir sempre um olhar diferenciado...,
      provocar as mais diversas leitura...,
      tocar a cada espectador conforme as suas vivências
      e ou expectativas diante da obra em questão.
      ..., pelo menos temos um coisa em comum:
      a maravilhosa fotografia.

      ..., grato pelos seus comentários.

      abs.

      T+
      Joba

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