quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Crítica: Caminhos da Floresta


Há algumas décadas os contos clássicos dos “pais” da literatura “para” crianças Charles Perrault (1628-1703), Jacob Grimm (1785-1863), Wilhelm Grimm (1786-1859) e Hans Christian Andersen (1805-1875) vêm despertando interesse de estudiosos e ganhando novas leituras e ou devolvendo histórias à sua origem, digamos, mais macabras. Em 2002 a DC Comics/Vertigo começou a publicar o sensacional título Fables (Fábulas), que traz os mais famosos personagens dos Contos de Fadas vivendo clandestinamente na Nova York dos dias de hoje. Em 2011 a hq acabou inspirando a série televisiva Once Upon a Time (Era Uma Vez). No entanto, bem antes das duas releituras, Stephen Sondheim e James Lapine escreveram o libreto do musical Into the Wood (Caminhos da Floresta), que junta num mesmo conto, entre outros, Bruxa, Chapeuzinho Vermelho e o Lobo, João (e o Pé de Feijão), Cinderela e Rapunzel. O espetáculo teatral, que estreou no Old Globe Theatre (San Diego) em 1986 e na Broadway (Nova York) em 1987, após várias remontagens de sucesso, “ganha” a sua versão cinematográfica.


Caminhos da Floresta (Into the Wood, EUA, 2014), dirigido por Rob Marshall, é um drama musical romântico com pitadas de humor e de horror. Observando a mesma estrutura do teatro, em seu primeiro ato os Caminhos da Floresta são iluminados pelos desejos: a Bruxa (Meryl Streep) quer recuperar a beleza; o Padeiro (James Corden) e sua Mulher (Emily Blunt) querem um filho; Chapeuzinho Vermelho (Lilla Crawford) quer chegar são e salva do Lobo (Johnny Depp) à casa da vovó; João (Daniel Huttlestone) quer seguir os conselhos da mãe (Tracey Ullman) e vender a vaca por um bom preço; Cinderella (Anna Kendrick) e Rapunzel (Mackenzie Mauzy) querem encontrar seus Príncipes (Chris Pine e Billy Magnussen).


Em seu segundo ato, os Caminhos da Floresta são assombrados pelo (alto) preço que os personagem devem pagar pela realização de seus desejos, pois, nem mesmo no Reino da Fantasia os desejos são de graça. Podem ser gratuitos, mas nunca de graça. O preço? A consciência de cada um em cada passo (mal?) dado na trilha da vida vulgar em busca de felicidade (que diz um ditado: não se compra!)..., assunto discutido com maestria no antológico romance de ficção científica Um Estranho Numa Terra Estranha (1961), de Robert A. Heilein. As questões morais (infidelidade, egoísmo, vaidade, insegurança, roubo, assassinato) que afligem os nossos velhos conhecidos também incomodam o espectador (O que você faria?). É a dialética da oposição (moral e imoral, luz e sombra) fazendo eco e sinalizando que talvez a Disney não seja tão irredutível assim.


Quase todo mundo sabe como terminam os Contos da Carochinha..., ou pensa que sabe, ao menos na imaginação, o que aconteceu a cada personagens após o Felizes para Sempre. Há algumas paródias divertidas (pela web, inclusive) em prosa, hqs e animações, sobre o depois do Final Feliz nos Contos de Fadas. Todavia, ainda que tenha uma sequência hilária (deliciosamente brega) com os Príncipes (Pine e Magnussen) cantando Agony, em uma cachoeira, Caminhos da Floresta está longe de ser considerado sátira. Também porque o seu conteúdo ainda guarda resquícios da época (de muitas máscaras de moralidade) em que foi criado o espetáculos teatral.


A adaptação de Caminhos da Floresta ficou por conta de James Lapine (um dos autores do libreto) e, em meio à polêmica puritana do corta não corta cenas da Mulher do Padeiro e do Lobo e Chapeuzinho Vermelho, só o destino de Rapunzel foi mudado. Só pra registrar: a alegada “falta de decoro” das personagens são ridículas se comparadas às novelas brasileiras (da tarde) e séries animadas televisivas. Evidentemente não é a versão definitiva sobre o futuro dos habitantes do Mundo do Faz de Conta, mas é, no mínimo, curiosa, com seu círculo vicioso, suas intrigantes metáforas e passagens (incorretas?) que devem deixar os mais puristas com a pulga atrás da orelha ao ouvir tiradas espirituosas, como a do Príncipe da Cinderela: “Fui criado para ser sedutor e não para ser sincero”.


Rob Marshall, que esteve ótimo na direção de Chicago e (a mim) decepcionou em Nine, embarca com vontade no enredo “fantasia”, costurando satisfatoriamente três universos diferentes: teatro, cinema e livro ilustrado, com excelentes soluções cênicas e bons efeitos especiais. Ainda que não tenha nenhuma música grudenta ou assobiável, Caminhos da Floresta tem composições surpreendentes. O elenco é bacana e dá conta do recado. Não espere grandes vozes (operísticas)..., estas são mais modestas, tipo gente comum (feito os personagens) cantando. O que não quer dizer que não arrebatem o espectador.

Enfim, vale ressaltar que Caminhos da Floresta é um filme para quem aprecia o Universo Fantástico, com suas histórias míticas, repletas de simbolismo infantil e adulto, mas que goste também de musical

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