terça-feira, 19 de abril de 2016

Crítica: O Caçador e a Rainha do Gelo


Quem gosta de literatura oral sabe que os contos populares reunidos em publicações sofrem alterações (independente ao quem conta um conto aumenta um ponto) para atender (principalmente) aos interesses de mercado. Já era assim na época de Charles Perrault (1628-1703) e de Jacob Grimm (1785-1863) e Wilhelm Grimm (1786-1859), cujas histórias em comum (anteriormente “destinadas” ao leitor e ou ouvinte adulto) têm lá as suas diferenças. Onde Perrault era trágico, os Grimm eram românticos ou divertidos. Aos poucos o mundo infantil nos livros foi ganhando cor, fantasia, magia, encantamento. Todavia, com as novas mídias contemporâneas, provavelmente muitas narrativas adaptadas do passado serão cada vez mais irreconhecíveis no futuro. Este parágrafo é o mesmo que escrevi na abertura da resenha crítica do filme Branca de Neve e o Caçador (2012). Por que ele foi replicado? Continue lendo!

No meu tempo de criança havia o Era Uma Vez e ponto. Hoje, se na literatura há estudos psicológicos dos personagens fantásticos e o resgate dos Contos Populares originários das Narrativas Orais, no esfomeado cinema (principalmente) hollywoodiano, há também o Era Uma Vez Antes e o Era Uma Vez Depois do Era Uma Vez tradicional. Na verdade, há Era Uma Vez para todos os gostos (inclusive os duvidosos), com releituras e misturas de Contos de Fadas, como: A Garota da Capa Vermelha (2011), João e Maria: Caçadores de Bruxas (2013), Jack - O Caçador de Gigantes (2013), Caminhos da Floresta (2014)..., entre outros. Todos, é claro, dispostos a desvelar o passado e ou o futuro dos famosos personagens literários. Todavia digitalizada, como nem todo novo autor ou roteirista tem a criatividade de um Grimm ou Perrault..., dá-lhe tralha.


Baseado em personagens criados por Evan Daugherty, para a sua “adaptação” de Branca de Neve e o Caçador, e no roteiro de Evan Spiliotopoulos e Graig Mazin, O Caçador e a Rainha do Gelo, dirigido por Cedric Nicolas-Troyan, é um Conto de Fadas do Contador de História doido. A trama acéfala, ao mesmo tempo prólogo e epílogo “explicativos” da origem do Caçador (Chris Hemsworth) e da psicopatia das irmãs rainhas Ravenna (Charlize Theron), a bela serial killer madrasta da Branca de Neve, e a genocida Freya (Emily Blunt), faz a gente pensar que a narrativa se passa num reino (malévolo?) paralelo. Vou tentar esclarecer no próximo parágrafo.

É mais ou menos assim: metade da história O Caçador e a Rainha do Gelo (The Huntsman: Winter’s War, 2016) ocorre no passado e metade no futuro dos fatos presentes em Branca de Neve e o Caçador. Tipo: no encantador reino de Branca de Neve, vivem a usurpadora e assassina Rainha Ravena (Theron) e sua ingênua e romântica e bondosa irmã Rainha Freya (Blunt)... - E a Branca de Neve? Já falo da Branca de Neve! Então, uma tragédia (anunciada?) suficiente para despertar o lado maligno de Freya (como deseja Ravena) acontece e a torna frígida. Porém, como a nova malvada não quer ser pedra de gelo sozinha, decide congelar o mundo (e vai comer o quê?) e “brincar” de genocídio de adultos e sequestro de crianças, que serão treinadas para matar e jamais amar e ou transar, digo, praticar sexo reprodutivo. Como é que nascem mais crianças, pra tomar o lugar dos guerreiros mortos, eu não sei! Deve ser geração espontânea! - E a Branca de Neve? Daqui a pouco falo da Branca de Neve! Ah, quer saber, vou falar é já! A Branca de Neve não é importante nessa história e portanto só vai aparecer, por alguns segundos, ajoelhada e de costas, no terceiro ato... Tá, eu sei que um monte coisas que disse é spoiler..., mas isso também não tem a menor importância.


Agora, continuando com a tramoia, digo trama, adivinhe quem está entre as primeiras crianças sequestradas? Exatamente! O menino Eric, o futuro caçador, e a menina Sara... - Quem é Sara? A Sara, quando crescer (e se tornar a Jessica Chastain) vai ser guerreira e fazer par romântico com Eric e por causa desse amor proibido pela bruxa frígida Freya serão punidos e então Eric vai ganhar o mundo e se tornar O Caçador e salvar a Branca de Neve no filme anterior e voltar para O Caçador e a Rainha de Gelo para ajudar o ex-arqueiro promovido a Príncipe William (Sam Clafin), marido (?) da Branca de Neve (que só aparece de costas por alguns segundos), a encontrar o diabólico Espelho Mágico que desapareceu do Castelo etc etc etc... - É só isso?


Bem, no primeiro ato, o espectador é blindado, digo, brindado com uma enfadonha sequência de matança (praticamente) sem sangue e sem fim, sequestros, treinamento e a mudança de personalidade das crianças/jovens (já visto em trocentos filmes sobre distopia!). No segundo ato, na viagem pelo Reino da Fantasia (repleto de graciosos bichinhos fofinhos figurantes), para encontrar o Espelho Mágico, o Caçador vai contar com a ajuda do anão Nion (Nick Frost), que saiu diretamente do filme Branca de Neve e o Caçador, e do novo anão Gryff (Rob Brydon). O Deadpool faria uma piada sobre os (apenas?) dois anões..., mas eu não ouso! No terceiro ato há o tão (?) esperado epílogo da redenção. É isso! - Como é isso? - Não vai dizer mais nada? Não tem mais nada a ser dito é só isso: duas rainhas psicopatas, dois guerreiros românticos, dois anões machistas e um espelho perverso em pé de guerra. Use a sua imaginação pra juntar essas sete informações num filme fantasia infantilóide de ação e aventura! - Mas... 

Ok! Considerando alguns bons efeitos e elenco de atores esforçados; belo figurino; e, pensando melhor, com uma trilha sonora inconvenientemente horrorosa (pra variar), argumento e roteiro sem pé nem cabeça, direção claudicante..., cá pra nós, sinceramente, esta é uma experiência, digamos, tresloucada. Se você não é um espectador exigente e só quer mesmo passar o tempo se empanturrando de pipoca e refri..., pode até gostar.

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