quinta-feira, 11 de março de 2010

Crítica: Bezerra de Menezes – O Diário de um Espírito


Bilheteria nunca foi sinônimo de qualidade, mas talvez seja de popularidade. Quando do lançamento de Bezerra de Menezes – O Diário de um Espírito, de Glauber Filho e Joel Pimentel, era tanto da falação que fiquei curioso. Mas só consegui vê-lo agora. No país da improvisação religiosa, tem muita gente que ainda confunde ficção e realidade. Os espíritas mais devotos vociferaram contra a crítica que achou o filme hediondo. Para eles, falar (mal) do filme é falar (mal) de Bezerra de Menezes.

Cinematograficamente falando, Bezerra de Menezes, o filme, é mesmo tão ruim que é difícil saber por onde começar a crítica. Ele me lembrou de quando era garoto (católico apostólico romano) e lia histórias em quadrinhos que contavam a vida dos santos. Era um martírio só. Àquele bando de mestres, santos e assemelhados taciturnos, carolas, infelizes, não tardei a mudar a leitura para os gibis mais alegres e de pura ficção: Contos de Fadas, Donald, Tarzan, Pimentinha, Gasparzinho, Bang-Bang, Terror... Fiquei pensando (querendo estar enganado), se a vida do médico Bezerra de Menezes foi tal qual a fragmentada no filme, deve ter sido horrível. Uma vida inteira sem alegria, sem prazer, sem amizades...

Ainda adolescente me tornei um livre pensador e, estudando Mitologia Grega, conheci um poema do escritor inglês Wordsworth que diz: Oxalá um pagão ainda eu fosse/ Por velhas ilusões acalentado/ A paisagem seria bem mais doce/ E o mundo muito menos desolado (O Livro de Ouro da Mitologia – Thomas Bulfinch, tradução de David Jardim Júnior – Edições de Ouro - 1967). Diz uma lenda que quando Cristo nasceu, um grito de dor ecoou por toda a Grécia: Deus Pã está morto! Pã era o Deus da Natureza, amante da música e inventor da sírinx. Com a morte da Pã morreu a inocência e com o Cristianismo nasceu a “abnegação” ampla, geral e irrestrita ao custo (ainda) de muitas vidas. Com o cristianismo acabou a alegria de viver e começou o martírio e a culpa sem fim. O cristão paga tanto pecado (desde antes de nascer) que nem sabe mais pelo que está pagando..., até parece a carga tributária brasileira. E ai de quem reclamar!

Apesar de pertinente, não vou falar do tema tabu das religiões: alegria e felicidade na Terra dos fiéis e não no Paraíso dos infelizes, mas sobre Bezerra de Menezes, o filme, e não o médico e espírita. Porque uma coisa, como se diz, é uma coisa e outra coisa é outra coisa. O filme, que não queria ser filme, pois pensava ser documentário, é uma espécie de cinebiografia meio aos trancos e barrancos e totalmente sem convicção. A começar pela narrativa enfadonha (pior que a de um audiolivro) em primeira pessoa, na voz de Carlos Vereza (Bezerra de Menezes), que provoca sono e desinteresse. O roteiro de Glauber Filho, em parceria com Andréa Bardawil, parece a incorporação de um espírito doido que não sabe o que faz num corpo alheio e nem o que fazer pra sair dele. A produção passeia pela infância triste e solitária de Bezerra e depois pela juventude triste e solitária de Bezerra e finalmente pela velhice triste e solitária de Bezerra que, mesmo tendo mulher e filhos, era triste e solitário. E isso tudo embalado por uma trilha chorosamente onipresente e onisciente e onirritante e onichata..., em alguns momento é tão alta que mal se ouve a narrativa (também chata) de Vereza (Bezerra). Será que também para o espírita é pecado ser feliz? Ou era o carma de Menezes?

Bezerra de Menezes, o filme, que nasceu de um convite para a realização de um documentário (para distribuição em DVD), feita aos diretores, pela Associação Estação da Luz, do Ceará tem uma linguagem primária e ultrapassada de especial de TV estatal do século (bem) passado. É uma espécie de anticinema, e não vai aqui nenhum mérito, pois não se trata de algo novo ou, no mínimo, experimental. Não há grandes interpretações, porque que não há o que interpretar: Sem trama, sem drama! Mesmo assim, na linha reta e sem nós que ele segue, sabendo que vai chegar, pelo menos, ao fim, um destaque deve ser dado à direção de arte. É uma pena que só ela se destaca nessa engrenagem enferrujada.

Para os fiéis espíritas e admiradores do personagem título, no entanto, qualquer comentário crítico ao filme é irrelevante, pois acreditam que ele prestou (mesmo que de encomenda) uma justa homenagem ao homem conhecido como: “médico das almas e dos pobres”. Sinceramente, o grande Bezerra de Menezes, um dos responsáveis pela difusão da Doutrina Espírita em todo o Brasil, merece reconhecimento melhor.

Em tempo, vi o novo trailer de Chico Xavier, de Daniel Filho, que estreia em Abril, e me pareceu tão ruim quanto este. É esperar pra ver.

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