sábado, 20 de março de 2010

Crítica: Um Sonho Possível


Um Sonho Possível
com amor, educação e esporte

Se o tema é altruísmo, então é assunto para o cinema americano. Aliás, americano faz filme com qualquer tema que lhe pareça interessante, arrebate platéias e gere muitos lucros. Todo ano tem sempre um ou dois carregados de sentimentos positivistas. Ele pode arrebanhar espectadores, ganhar prêmios, até mesmo Oscar (Sandra Bullock), mas será que arrebata os devidos corações?

Sei que existem pessoas com muito mais talento que eu, mas que nunca chegaram lá. Então, se as pessoas ouvirem a minha história, vão saber que, se dermos uma chance a alguém, haverá esperança para essa pessoa”. Michael Oher

Um Sonho Possível (The Blind Side, EUA, 2009), dirigido John Lee Hancock, baseado em The Blind Side: Evolution of a Game (o título se refere a uma tática do futebol americano) de Michael Lewis, é um típico filme-família e seus valores cristãos. Ele retrata, de forma bastante linear, o convívio de um enorme adolescente Michael Oher (Quinton Aaron), negro, pobre e sem-teto, com uma família branca. Certa noite fria, véspera do Dia de Ação de Graças, ele é abordado por Leigh Anne Touhy (Sandra Bullock) que, num inesperado gesto de bondade, o leva pra sua casa, onde passa a viver. Leigh é uma mulher sofisticada, tem uma loja de decoração, é casada com Sean Tuohy (Tim McGraw), dono de uma rede de restaurantes, e mãe da adolescente Collins Tuohy (Lily Collins) e do adorável menino SJ Tuohy (Jae Head). Para a família, a presença de Mike, um estranho sem qualquer referência (ou documentos), que logo é amado e tratado com um filho e um irmão mais velho, não representa nenhum problema (ou perigo). O mesmo se repete na Wingate Christian School, onde conseguiu uma vaga, mais pelo seu tamanho (promessa esportiva) do que pela escolaridade, e se sente uma ilha, cercado de brancos por todos os lados.

Em Um Sonho Possível ou O Lado Cego (conforme o título original e menos vendável no Brasil) tudo é muito light ou muito diet, até mesmo as discussões pertinentes sobre preconceitos ou drogas. Talvez tenha sido uma (oportuna) opção poupar as pessoas de cenas incômodas ou de violência (apenas uma explícita) e focar mais na questão da adoção, na valorização da família, no fortalecimento da educação, na prática esportiva..., do que em conflitos que, de certa forma, até podem ser evitados (?). Não fosse baseado num livro biográfico, o filme poderia passar por uma edificante e inacreditável história de perseverança e determinação de uma socialite que se envolve em uma causa social. Muita gente vai se emocionar, rir, refletir e até mesmo prometer que se tivesse muito dinheiro, também faria algo parecido. Será? Qual a diferença, a distância e o significado de altruísmo e oportunismo? Quando este é um gesto de caridade ou de puro marketing? Toda ação gera um reação e ou vice-versa? É agir ou conhecer, pra ver.

Apesar da boa intenção, Um Sonho Possível, com todos os elementos de um conto de Dickens: um garoto pobre e sem-teto que tira a sorte grande ao ser encontrado, numa noite fria, por uma família rica que o acolhe e aposta num futuro digno para ele..., é um filme apenas mediano, tradicional, sem surpresas. Uma produção bem ao gosto do lucrativo público comum e que, às vezes, se perde na sua eloquente intenção filantrópica, evidenciando exageros e monotonia, por conta de personagens (reais ou não) que parecem isentos de pecados. Tanta correção e bondade faz a gente até duvidar da veracidade da história.

Se esta história não for contada, as pessoas podem supor que Michael Oher é apenas um grande atleta predestinado a estar na NFL. Mas quando olhamos mais de perto, vemos que se ele não tivesse saído daquele ambiente não teria sequer chegado ao campo de futebol americano da escola de ensino médio, e muito menos à universidade e à NFL. Já estaria morto ou na cadeia, ou simplesmente esquecido”. Michael Lewis

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