quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Crítica: Os Boxtrolls


A Laika é uma produtora singular que vem se destacando, tanto pela excelência técnica e quanto pela qualidade dos enredos, num universo muito particular (pela complexidade) da animação em stop-motion. Até onde se saiba, é a única que trabalha com temas sombrios, melancólicos..., porém divertidos, como os fascinantes curta Moongirl (vídeo sem legendas, 2005) e os longas Coraline (2009) e ParaNorman (2012).

Em Os Boxtrolls, a viagem é para os subterrâneos da amontoada Pontequeijo (Cheesbridge), abrigo dos simpáticos trolls, que se vestem com caixas de produtos diversos e de onde tiram seus pitorescos nomes (Peixe, Chulé, Ovo). Os moradores da vitoriana cidade os temem, por acreditar que, além de roubar seus preciosos queijos, eles sequestram e matam bebês humanos. Para dar fim às odiadas criaturas, as autoridades locais contratam o exterminador de pestes Arquibaldo Surrupião, da Companhia dos Homens dos Chapéus Vermelhos, que emprega o maldoso Sr. Rude e os inocentes úteis Sr. Picles e Sr. Truta. O caçador Surrupião é um homem ambicioso que fará de tudo para dar cabo das adoráveis criaturas e ocupar um lugar à mesa de queijos da Sociedade dos Chapéus Brancos. No entanto, um bebê (Ovo) desaparecido há dez anos e um garotinha (Winnie) da sociedade podem transformar o seu sonho, de troca de chapéu, em um explosivo pesadelo.
  

Baseado no livro Here Be Monsters (2005), de Alan Snow, a animação de aventura e suspense Os Boxtrolls (The Boxtrolls, 2014), dirigida por Graham Annable e Anthony Stacchi, é um achado maravilhoso. O seu contexto não marca página nas histórias comuns. O roteiro inventivo, de Irena Brignull e Adam Pava, parece saído das páginas clássicas de Charles Dickens, tão rica é a reflexão sobre os perturbadores vícios humanos que, sem o menor teor de pieguice, estão na tela e em linguagem acessível a qualquer público.

Com seu estilo steampunk-vitoriano, Os Boxtrolls é de uma contemporaneidade absurda. Em meio a acontecimentos bizarros, traz à tona assuntos pertinentes, como aparência (física), conveniência (social), corrupção (política), família (desestruturada), preconceito (racial). Tudo, é claro, entre uma dose e outra de humor infantil, nonsense, negro,..., para fixar a mensagem nos futuros formadores de opinião. As tocantes discussões morais entre Sr. Picles e Sr. Truta, sobre o perverso trabalho que executam, são antológicas.


Considerando que a narrativa desenha uma história cativante e altamente reflexiva; que não há nenhuma luta pela tomada de poder; que a eficácia do discurso cínico, ou melhor, irônico, provoca o espectador (principalmente em véspera de eleições), expondo a mesquinhez de pessoas em uma luta de classes por status, por um lugar no rol das celebridades (descerebradas!) que, no alto da sua hipocrisia, decidem se devem investir na fabricação de queijo ou na construção de hospital para crianças; que os personagens são muito bem escritos e desenhados; que os diálogos (ainda que dublados!!!) são ótimos; que tecnicamente é irretocável..., Os Boxtrolls é uma animação imperdível!!!

NOTA: Há uma genial e desconcertante sequência pós-créditos finais. A conversa afiada sobre “quem somos” realmente cala fundo, quando nos atentamos para a pontuação do texto nas entrelinhas! Talvez você diga: Ora, mas isso eu já sei! Saber ou não da tese é mero detalhe. A grande questão é como se livrar do cabresto....

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