sábado, 26 de setembro de 2015

Crítica: Perdido em Marte


Os títulos em português brasileiro para obras (principalmente) cinematográficas é matéria para as mais diversas teorias (da conspiração?) na internet. Eu mesmo já comentei em outras ocasiões sobre esta ignóbil mania (estraga prazeres) que estupidifica o espectador com seu spoiler e ou por ter nada a ver com o assunto..., como é o caso do Perdido em Marte, versão livre de The Martian (O Marciano), do romance escrito por Andy Weir e que inspirou o sci-fi homônimo de Ridley Scott. Pra começo, meio e fim de conversa, o astronauta Mark Watney, de Matt Damon, não está “Perdido em Marte”, se muito, foi “Deixado em Marte”.  O título original não é mero capricho e ou achismo do autor, está muito bem inserido e justificado, com ironia, na história.


Perdido em Marte (The Martian, 2015) gira ao redor do astronauta e botânico norte-americano Mark Watney (Matt Damon) que, durante uma tempestade de areia, ao ser atingido por detritos e perder a consciência, é dado como morto e deixado em Marte, pela tripulação da Nave Hermes. Ao recobrar a consciência, ferido e a milhões de quilômetros de qualquer outro ser humano, mais que se lamentar, ele decide que vai viver pelo maior tempo possível. Usando sem moderação (e modéstia) o seu conhecimento de botânica e de matemática, no consumo balanceado do alimento disponível no Laboratório Hab, ele calcula que terá uma sobrevida de uns dois anos. E mais, certo de que, mesmo que a Agência Espacial descubra que está vivo, não haverá tempo hábil para um resgate, se põe a gravar um diário, registrando em vídeo o seu progresso (Nem sei quem vai ler isto. Acho que alguém vai acabar encontrando. Talvez daqui a cem anos. Que fique registrado: não morri em Sol 6. O restante da tripulação certamente achou que eu tivesse morrido, e não posso culpá-los. Talvez decretem um dia de luto nacional em minha homenagem e minha página na Wikipédia vá dizer: “Mark Watney foi o único ser humano que morreu em Marte.” E, provavelmente, isso estará correto. Porque, sem dúvida, vou morrer aqui. Só que não em Sol 6, como todo mundo está achando., tradução de Marcelo Lino  para a edição brasileira da Arqueiro)..., até que acaba encontrando uma forma de se comunicar com a Terra, causando surpresa e suspense na NASA.

Assim uma fantástica corrida contra o tempo se inicia. Enquanto em Marte, o botânico faz valer a sua formação acadêmica, usando a ciência (real) para resolver questões relacionadas à sua sobrevivência (produção de água e de alimento), na Terra os cientistas da NASA esmiúçam a física para encontrar uma forma de resgatá-lo com vida.


Dirigido com vigor por Ridley Scott, que há muito devia um entretenimento de excelência ao seu público, Perdido em Marte é uma ficção científica literalmente engenhosa (ou seria literalmente científica?), principalmente por conta de seu simpático protagonista Mark Watney (“Se o oxigenador quebrar, vou sufocar. Se o reaproveitador de água quebrar, vou morrer de sede. Se o Hab se romper, vou explodir. Se nada disso acontecer, vou ficar sem alimento e acabar morrendo de fome. Então, é isso mesmo. Estou ferrado.”), num show arrebatador de Matt Damon.

O roteiro de Drew Goddard é cativante, divertido e plausível na sua “decupagem” nerd, meio que uma longa e bem-humorada palestra sobre os percalços (?) da fascinante exploração espacial que nos aguarda num futuro próximo. Fiel à linha da elogiada pesquisa científica que norteou romance homônimo de Weir, passa ao largo da pretensiosa (e inócua) especulação metafísica de Interestelar (2014) de Christopher Nolan, onde Damon fazia o papel (sem pé nem cabeça) de Mann, um astronauta psicopata “à espera de resgate” num planeta gelado e inóspito (ou seja, do gelo inconsistente para a caldeirinha consciente).


A trama, que acaba se dividindo em três núcleos distintos de ação (Marte, NASA, Nave Hermes), não está interessada na ciência especulativa, mas na ciência prática que (sem pieguice e ou lição de moral) pode resolver questões cruciais para o desenvolvimento e sobrevivência da humanidade (na Terra ou no Céu). Mas, fique tranquilo(a), a gente absorve facilmente as razoáveis explicações científicas e fica até tentado a dar sugestões..., ou estudar com mais afinco a matéria.

O grande trunfo de Perdido em Marte, cujo argumento pode até soar banal (a história de um resgate), está na condução da narrativa que começa como drama leve (?) da persona esperançosa (mas conformada) do engraçado astronauta Mark, vai ganhando corpo e emoção e quando menos se espera, envolve o espectador num suspense inquietante que o deixa antenado até a última cena. É impossível não torcer pelo simpático e solitário botânico, com suas ironias e reflexões (diante de um crucifixo de madeira, por exemplo) a milhas e milhas e milhas do Planeta Azul. Ou ficar indiferente às decisões burocráticas e técnicas dos cientistas da NASA a milhas e milhas e milhas do Planeta Vermelho.


Perdido em Marte é um filme sublime. Inspirador! O seu elenco, de ótima safra (Chiwetel Ejiofor, Jeff Daniels, Jessica Chastain, Donald Glover, Sean Bean, Kristin Wiig, Benedict Wong, Sebastian Stan, Kate Mara, Michael Peña), capitaneado pelo irretocável Matt Damon, dá o seu melhor..., até mesmos os menos coadjuvantes se destacam nas performances. Sequências impressionantes, bons diálogos (ou monólogos comoventes!), efeitos especiais de qualidade, montagem caprichada, trilha “disco music” para os nostálgicos, com direito ao bônus da contagiante glam rock Starman, de David Bowie..., fecham o belo pacote. Imperdível!!!

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